Na fila da vacinação

29/01/21 | Lutas no Brasil

No dia 14/01, foi lançado o movimento “Profissionais da Educação: vacina já!”, capitaneado pelos deputados federais Idilvan Alencar (PDT-CE) e Professora Dorinha Seabra (DEM-TO). A campanha pede que os profissionais de educação tenham prioridade na vacinação contra a Covid-19.

O movimento tem apoio de muitas entidades educacionais – como o Conselho Nacional de Secretários de Educação (Consed), a Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação (CNTE), a União dos Dirigentes Municipais de Educação (Undime), e o movimento Todos Pela Educação, que estiveram presentes no evento on-line de lançamento. Governadores, como Fátima Bezerra (PT) do Rio Grande do Norte e Camilo Santana (PT), do Ceará, também já posicionaram a favor.

No dia 15 de janeiro, o prefeito de São Paulo Bruno Covas enviou um ofício ao Ministério da Saúde, solicitando que os profissionais da educação fossem incluídos na fase 1 do calendário nacional de vacinação contra o Covid-19.

Para entender os motivos e a importância dessa priorização, o Portal CENPEC Educação conversou com o deputado federal Idilvan Alencar, o presidente da CNTE Heleno Araújo, e a enfermeira, doutora em epidemiologista e pesquisadora da Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes) Ethel Maciel.

Os prejuízos do ensino remoto
Por mais que educadores(as) e gestores(as) estejam se desdobrando para garantir atividades remotas e o vínculo dos(as) estudantes com a escola, é fato que o ensino remoto têm efeito danosos não só para a aprendizagem, como para a saúde e a segurança de crianças e adolescentes.

De acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), mais de 1,5 bilhão de estudantes foram afetados pelo fechamento das escolas no mundo todo, e quanto mais tempo um estudante fica longe da escola, maiores a chance de abandoná-la.

“Eu costumo dizer que são os efeitos invisíveis da pandemia. Infelizmente, na área da saúde, nós contamos os mortos, os infectados. Na economia, contabilizamos as empresas que fecharam, o desemprego, a queda do PIB. Agora, na educação, qual é o prejuízo de um ano de escolas fechadas? Não conseguimos ver esse efeito, e tem gente que acha que está tudo bem – e não está.” declarou o Deputado Idilvan Alencar.

Por isso, a reabertura das escolas está no centro do debate educacional – e a sua importância é um consenso e um fato. O debate gira em torno de quando isso deve acontecer, e sob quais condições.

Para Heleno Araújo, presidente da CNTE, a reabertura deve estar condicionada à vacinação dos(as) profissionais de educação: “O que estamos sempre afirmando é que não queremos furar fila nem passar na frente de ninguém. Queremos dialogar, participar do processo de planejamento dessas etapas, e queremos que o governo tenha coerência ao tomar essas decisões. Se há uma imposição de retornar as atividades presenciais dia 1º de fevereiro, esse retorno tem que estar ligado com a vacinação dos profissionais de educação”.

Aulas presenciais somente com vacina
Plano Nacional de Operacionalização da Vacinação contra a Covid-19, divulgado pelo Ministério da Saúde, já coloca os profissionais de educação entre os grupos prioritários, mas na quarta fase de vacinação.

“Janeiro vai acabar e nós não conseguimos atender todos da primeira fase. Além disso, tem as incertezas com relação à produção da vacina, se haverá insumos para tal. A questão é quando vai chegar a quarta fase? Final do primeiro semestre, final do ano?”, questiona Heleno.

Considerando o atual momento da segunda onda de Covid-19 no Brasil, a epidemiologista e pesquisadora Ethel Maciel também acredita que as escolas brasileiras devem ser reabertas somente com a vacinação desses(as) profissionais. Em setembro e outubro do ano passado, quando, em algumas redes, as escolas reabriram para aulas presenciais, estávamos em uma fase de diminuição dos casos. “No Brasil, diferente de outros países onde o turno de trabalho coincide com o turno escolar, as crianças não ficam na escola em tempo integral. Muitas ficam com idosos ou alguém da família (às vezes de grupo de risco) enquanto os pais trabalham. Então se vacinássemos os trabalhadores da educação na fase II, a mesma das pessoas acima de 60 anos, teríamos uma segurança maior.”, declarou Ethel Maciel.

Crianças como grandes transmissoras
Um estudo da OMS de outubro do ano passado, que traz o que era sabido até então sobre a transmissão de Covid-19 nas escolas, dizia que as crianças menores de 10 anos são menos suscetíveis ao contágio da doença, mas que o papel delas na transmissão ainda não era totalmente conhecido.

Também indica que é improvável que as crianças e as escolas sejam os principais transmissores de Covid-19 – mas quando a transmissão comunitária é baixa e os protocolos sanitários são aplicados.

De acordo com Ethel, estudos que saíram esse ano trazem novas informações e evidências de que a escola é um importante local de transmissão da Covid-19 e que as crianças são grandes transmissoras.

Ela cita, por exemplo, o caso do Reino Unido, onde as escolas se mostraram locais de transmissão mais importantes que os hospitais. De acordo com relatórios da Public Health England, agência governamental de saúde pública britânica, 26,5% dos surtos de infecção entre outubro e dezembro de 2020 tiveram ligação com escolas e instituições educacionais, enquanto apenas 8% ocorreram em hospitais.

O Reino Unido passa atualmente por um novo lockdown, com o aumento do número de casos no Reino Unido, devido à mutação mais contagiosa do coronavírus. As escolas estão fechadas e podem reabrir em março. Outros países europeus, como Portugal, também voltaram a fechar suas escolas com a segunda onda da pandemia.

Protocolos insuficientes para a realidade brasileira
Ainda não há pesquisas brasileiras que olhem para a escola e o seu papel na transmissão do novo coronavírus.

No inquérito epidemiológico que realizou no Espírito Santo, com recorte só para crianças e adolescentes, Ethel identificou que há muitos assintomáticos. “Por exemplo, menos de 40% dos infectados tiveram febre, e a medição de temperatura é um dos protocolos sanitários nas escolas. Ou seja, a doença vai passar desapercebida, e os estudantes a estarão transmitindo”, explica.

A pesquisadora acredita que é difícil os protocolos sanitários darem conta da complexidade das escolas brasileiras: “Além dos problemas de infraestrutura, não tivemos a contratação de novas pessoas. O professor não é um agente sanitário. É muito difícil que ele tenha que assumir seu papel pedagógico, e tomar conta do cumprimento dessas medidas sanitárias”.

Para Heleno Araújo, é essencial que governo invista em pesquisas que retratem a realidade do país: “Nós atuamos na escola pública, atendemos os estudantes que vivem nas famílias que estão na extrema pobreza, que não têm uma casa adequada para morar, que se expõem a todo momento. Precisamos de estudos que façam o diagnóstico da nossa realidade e que, a partir desse diagnóstico, se apliquem as políticas necessárias para atender a nossa demanda.”

(CENPEC Educação, 28/01/2021)

FONTE: CNTE
FOTO: REPRODUÇÃO

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