Entidade federal responde que “trabalho reflete grau de maturidade do pesquisador no início das etapas da pós-graduação”
Trechos da enciclopédia virtual Wikipedia e de trabalhos de autores acadêmicos foram identificados sem crédito na dissertação de mestrado da nova presidenta da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), Cláudia Queda de Toledo. Ela foi nomeada na última quinta-feira (15), após a demissão de Benedito Guimarães Neto.
Os indícios de plágio foram revelados pela coluna de Lauro Jardim, no jornal O Globo. O Brasil de Fato checou os trechos citados e confirmou que todos aparecem na tese de Cláudia e também nas publicações originais. A tese de Toledo foi defendida na Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), e tem o título “O ensino jurídico no Brasil e o Estado Democrático de Direito: análise crítica do ensino do Direito Penal”.
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Na página 43 da tese, em trecho sobre os significados etimológico e prático do termo projeto, o texto da nova presidenta da Capes é praticamente igual à definição encontrada no artigo “Contribuição à construção de projetos político-pedagógicos na enfermagem”, de Rosita Saupe e Elioenai Dornelles Alves. Há apenas a mudança de algumas palavras.
Saupe e Dornelles (este falecido em 2015) são pesquisadores reconhecidos no estudo da enfermagem, com livros publicados e contribuições em centenas de bancas. Na tese de mestrado de Toledo, os dois não são citados em momento algum, apesar da relação explícita entre os dois textos.
No mesmo trabalho, Cláudia Queda de Toledo dedica alguns parágrafos para falar sobre a Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB). Em dois trechos, o texto é equivalente a excertos da página da Wikipedia sobre a referida norma legal, publicados em 2006.
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O plágio acadêmico é considerado crime no Brasil desde 1998. O Código Penal (Artigo 184) prevê multa e detenção dos responsáveis pela cópia. Caso a irregularidade seja descoberta após a conclusão do mestrado ou doutorado, os títulos podem ser perdidos e os diplomas, cassados.
Nomeação recebe críticas
Dois dias após a nomeação de Cláudia, reitores da Universidade São Paulo (USP), Universidade Estadual Paulista (Unesp) e Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) divulgaram uma carta pública com críticas à presença dela no cargo.
No texto, eles afirmam que a nomeação poderia trazer “enormes dificuldades na gestão futura da Capes”, porque a nova presidenta não teria “a qualificação técnica, o abrangente conhecimento sobre a pós-graduação e sobre o sistema de educação e o currículo acadêmico” suficientes para o cargo.
Ainda de acordo com a carta, ter “legitimidade para o diálogo institucional é pré-requisito” para que as estratégias de consolidação da pesquisa brasileira alcancem êxito. “Um dirigente da Capes dialoga com os mais variados órgãos acadêmicos e da administração pública, diálogo este que se insere no contexto da busca de soluções para problemas complexos”, diz o texto.
Em outro trecho, os reitores são enfáticos: “Liderar este diálogo exige preparo, conhecimento profundo sobre o sistema e sobre o estágio da ciência brasileira, para que, a partir da complexidade do cenário atual, se definam as estratégias de futuro. O desenvolvimento científico e tecnológico do país não permite improvisações”.
Capes se pronuncia
Em nota, a Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior se pronunciou sobre o caso. Segundo o texto, a dissertação de Cláudia “reflete o grau de maturidade do pesquisador no início das etapas da pós-graduação” e “foi considerada apta pela banca examinadora”.
A manifestação da Capes ressalta ainda que a dissertação, “como todo e qualquer trabalho acadêmico, não é um texto final. Permite aprimoramentos, revisões e correções, daí a relevância da crítica da banca examinadora e da comunidade acadêmica”.
Sobre as passagens identificadas em outros locais, a instituição afirma que “referem-se a elementos descritivos de elaboração de textos normativos ou planos de gestão acadêmica. Não se referem a ideais, conceitos teóricos ou a dados experimentais obtidos por outros autores e incluídos sem referências”.
“A existência de plágio pressupõe dolo, atuação deliberada, vontade de se apropriar de textos originais alheios. Nada disso ocorreu na dissertação. É preciso não confundir tais situações, que são suscetíveis de ocorrer em dissertações e teses, além de outras como erro de datas, supressão de notas de rodapé ou traduções não mencionadas, com a intenção de plagiar”, conclui a manifestação da Capes.
FONTE: BRASIL DE FATO
FOTO: Reprodução do Twitter