Leia na coluna de Henrique Rodrigues: “O presidente antivacina está surtado, enquanto o chanceler biruta diz ter orgulho de ser um pária. Nesse meio-tempo, o ministro da Economia tenta vender o SUS na feira do rolo e o chefe do Meio Ambiente defende grileiros e incendiários. O Brasil é como um filme do Borat”
Venho escutando dos mais otimistas que 2022 está logo ali e que então poderemos unir forças contra esse pesadelo psicodélico que vivemos diariamente. Tenho sérias dúvidas é sobre o que restará do Brasil até lá.
O poço não tem fundo. Chegaremos em breve ao magma da bizarrice e sabe-se lá quantos e quais cacos sobrarão até a próxima eleição.
Durante esta semana fomos surpreendidos pelo pacotão de medidas do Guedes, que tentou, na surdina e via decreto, vender ao setor privado o serviço de UBS’s prestado pelo SUS.
É, assim! Chegou, deu um migué e lançou as bases para a privatização do Sistema Único de Saúde como se ele e o desequilibrado do presidente fossem donos do Brasil. Atropelaram a Constituição, o Congresso Nacional, o Conselho Nacional de Saúde, estados, municípios e o escambau. A algazarra foi tão grande (e a ideia cretina também) que tiveram que voltar atrás.
Dias antes, o ministro das Relações Exteriores, Ernesto Araújo, que vem ampliando as definições de loucura e delírio sempre que pode, disse na formatura de novos diplomatas do Itamaraty que o Brasil tornou-se um pária na comunidade internacional e que tem muito orgulho disso.
No mesmo discurso ele ainda atacou João Cabral de Melo Neto (patrono escolhido pela turma) e comparou-se a ele nos predicados literários, o que só reforça a tese de que o problema de Ernesto é psiquiátrico.
Enquanto isso, Ricardo Salles, o ministro do Meio Ambiente invertido (o sujeito que ganha para defender a natureza e que diariamente toma medidas para destroçá-la) resolveu responder, com quatro dias de atraso, a um tuíte de Rodrigo Maia, presidente da Câmara dos Deputados, que o criticava.
“Nhonho”.
Sim, esta foi a resposta.
Peraí… Tente entender: o presidente da Câmara criticou um ministro de Estado no Twitter e ele, quatro dias depois, “xingou” o parlamentar de Nhonho, numa referência ao personagem gordo do seriado mexicano Chaves.
A Esplanada dos Ministérios é hoje uma espécie de recreio do Ensino Fundamental. Eu até imagino o Jairzinho jogando futebol com uma garrafa pet amassada, todo babado da merenda, fedendo a azedo, enquanto Ernestinho fala sozinho e faz careta no canto do pátio. Ricardinho, o piromaníaco com cara de anjinho, segura um isqueiro e pensa em tacar fogo nas samambaias da diretora, ao passo que Paulinho arranca dinheiro dos menores na fila da cantina.
O pau come no Brasil e os broncos duelam para ver quem é o mais abjeto. Despreocupado, o mandatário da pátria costura um movimento contra a vacinação, em aliança com setores sociais que apresentam déficit de lucidez.
Eu já devo ter feito essa pergunta um milhão de vezes, inclusive aqui. Mas, como foi que chegamos a esse ponto?
Olhe só para essa maluquice toda e tente refletir e se questionar: por que cargas d’água optamos por colocar todo esse entulho no comando da nação? Veja a atual situação e diga se algum dia você imaginaria esse turbilhão infernal de insanidades sendo praticado à luz do dia, desavergonhadamente, por gente que se esconde atrás das instituições do Estado.
O presidente antivacina está surtado, enquanto o chanceler biruta diz ter orgulho de ser um pária. Nesse meio-tempo, o ministro da Economia tenta vender o SUS na feira do rolo e o chefe do Meio Ambiente defende grileiros e incendiários. O Brasil é como um filme do Borat.
Quando 2022 chegar, será preciso um inventário minucioso do que sobrou sem ser afetado pela indigência/insanidade administrativa.
Deixando de lado o deboche, creio que todo brasileiro com algum zelo pelo país, que preze minimamente por condições democráticas, sociais e econômicas elementares, já deve ter notado que a contaminação da máquina pública e das instituições oficiais é tão profunda que dificilmente uma remoção e expurgo por via eleitoral irá garantir a volta à normalidade.
Generais falam abertamente sobre cargos políticos, fazem ataques a nações estrangeiras amigas, discursam a ladainha abobalhada da ideologia dos lunáticos, enquanto funcionários de primeiro e segundo escalões cometem as maiores peripécias inacreditáveis sem qualquer pudor ou discrição.
A contaminação é profunda e essa postura absurda e nonsense arraigou-se muito rapidamente.
Se já não bastasse toda vergonha e transtorno intermitentes pelos quais passamos, provavelmente não haverá normalidade por muito tempo, mesmo após o lamaçal institucional ser chutado porta afora.
Mais do que força para reverter o quadro, precisaremos de resiliência e paciência para tentar restaurar os escombros que sobrarem do Brasil.
FONTE: REVISTA FÓRUM
FOTO: REPRODUÇÃO