Para João Felício, imprensa politiza greve e criminaliza sindicatos

12/05/15 | Lutas no Brasil

São Paulo – A greve dos professores em São Paulo completa 51 dias hoje (5) e ainda não há avanços que permitam prever a retomada de rotina no ensino público. Mas um olhar para a história das lutas da categoria mostra que as longas mobilizações e a pouca disposição de governos para dialogar são marcas do ensino público estadual pelo país afora.

Em São Paulo, as greves com a mobilização pelo Sindicato dos Professores do Ensino Oficial do Estado de São Paulo (Apeoesp) começaram em 1978, quando o movimento sindical no país se reorganizava para sair da paralisia imposta pelos anos do regime de exceção. Desde então, em vários momentos os professores tiveram de apelar para o recurso da greve, e 1989 entrou para a história da Apeoesp como o ano do mais longo movimento, com 80 dias em defesa da escola pública e da dignidade salarial dos docentes.

Mas se, apesar do tempo, em linhas gerais as mobilizações seguem a mesma toada, com dificuldades de negociações e longas greves, o que mudou do passado para hoje? “A diferença hoje em relação à época dos governos de (Paulo) Maluf, (Orestes) Quércia, (Luiz Antonio Fleury Filho) Fleury é que não tínhamos, como hoje, a hostilidade da imprensa paulista. Não havia essa coisa ostensiva contra a greve. Hoje há mais hostilidade do que no passado, e isso é do governo (Mario) Covas para cá”, afirma João Felício, secretário-adjunto de Relações Internacionais da CUT, presidente da Apeoesp de 1987 a 1991 e atual presidente da Central Sindical Internacional (CSI).

“A imprensa paulista tem ódio da gente e por isso criminaliza os movimentos sociais e sindicatos, essa é a principal diferença da realidade de hoje com 20 anos atrás. Depois que os tucanos chegaram ao poder, a imprensa passou a ter comportamento hostil e neoliberal, criminalizando as mobilizações”, continua Felício.

“O que é diferente neste ano em relação a outras mobilizações é que agora estamos conseguindo avançar pela manutenção dos direitos, mas não pela questão salarial”, afirma Marta Vanelli, secretária-geral da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação (CNTE). Ela também considera que no passado, sobretudo na época da criação da CUT e do surgimento de um novo sindicalismo no país, mais combativo e focado no interesse do trabalhador, a mobilização ia às últimas consequências, enquanto hoje “em alguns casos estamos lutando para segurar o que foi conquistado”.

A própria reivindicação do movimento neste ano em termos de reajuste salarial, de 75,33%, tem a ver com as conquistas a que Marta se refere. Esse índice representa uma equiparação de reajuste semelhante a outras categorias de servidores públicos com formação superior e está previsto entre as metas do Plano Nacional de Educação (PNE), sancionado no ano passado pelo governo federal. “Os governos têm seis anos para cumprir essa meta, um ano já foi, e esperamos que em São Paulo o governador Geraldo Alckmin (PSDB) diga como vai cumpri-la”, diz Marta. “O que não pode é oferecer zero.”

De fato, as manifestações hostis da imprensa aos professores, como se refere Felício, são o que não falta na mídia tradicional. “Desde que o PT existe, a Apeoesp é um mero aparelho da legenda. Usa os professores como massa de manobra da política do partido”, afirmou o jornalista ultraconservador Reinaldo Azevedo, em seu blog na revista Veja, em 27 de abril, onde cotidianamente se posiciona contra as pautas progressistas.

No Paraná, o governador tucano Beto Richa, que na quarta-feira (29) colocou a polícia contra os grevistas de forma truculenta e produziu mais de 200 feridos, adota o mesmo expediente do blogueiro reacionário de Veja. Segundo o governador, o sindicato dos professores (APP) e a CUT atuam como “braços do PT”. Isso acaba por dar contorno político a mobilizações que na verdade são motivadas por uma situação financeira até de penúria, em alguns casos.

“Nós não fazemos greves políticas, como somos acusados. Seria bonito, mas as greves nossas são eminentemente econômicas, estamos colocando em discussão a nossa condição de vida. E a imprensa joga a população contra nós, é má-fé. Não vejo nenhum editorial reconhecendo que o professor ganha mal. Por que a imprensa não faz uma campanha de valorização do professor? A imprensa só valoriza movimentos como o “Vem Pra Rua” (da direita), enquanto a nossa pauta é pela valorização do professor”, afirma Felício.

Assuntos relacionados