Os motores econômicos da deterioração ambiental

09/10/15 | Lutas no Brasil

É preciso analisar a instabilidade do setor financeiro mundial. Sem entrar nesse assunto, não poderemos entender os motores da deterioração ambiental.

Quais são os motores da degradação ambiental? Esta é uma pergunta normal em todos os debates sobre meio ambiente. Nessa discussão, o papel das grandes corporações internacionais aparece com frequência – especialmente as diretamente vinculadas ao lobby dos combustíveis fósseis. A mentira da companhia Volkswagen para criar a aparência de que os seus veículos como mais eficientes e menos contaminantes nos faz lembrar da importância de melhorar a nossa análise sobre as causas e os motores da degradação ambiental.

Em 2005, foram publicados os resultados da Avaliação do Ecossistemas do Milênio (AEM), exercício patrocinado pelas Nações Unidas para estudar os principais ecossistemas do mundo. O principal resultado foi descobrir que a atividade humana, na segunda metade do Século XX, alterou os ecossistemas do mundo como nunca antes em toda a história. Ao redor de 60% dos serviços fazem com que os ecossistemas do mundo sejam degradados ou explorados de forma insustentável.

Ao tratar o tema das causas ou motores deste processo de degradação, o estudo considerou vários enfoques alternativos. Depois de discutir brevemente problemas de escala, horizontes temporais e esquemas de hierarquização, a AEM decidiu classificar as forças que impulsam a degradação ambiental como motores “diretos” e “indiretos”. Os motores diretos são aqueles que contribuem para a deterioração ambiental de forma imediata: novas estradas, obras de infraestrutura, plantações comerciais em lugares de bosques, incêndios, etc. Já os motores indiretos são o crescimento econômico e o aumento da população. E, em algumas páginas, se dispôs a comentar esses fenômenos.

Desde 2005, a grande maioria das organizações internacionais que trabalham sobre a deterioração ambiental adotou essa classificação. Essa também é a opinião de muita gente e se tornou quase um lugar comum citar essas duas “causas da deterioração ambiental”. Mas um exame rápido do que está por trás desses “motores” revela que as coisas são mais complicadas.

Para começar, o crescimento econômico não tem sido um processo regular. Entre 1945 e 1975, a taxa de crescimento da maioria dos países foi alta, mas entre 1975 e 2000, o ritmo de crescimento se reduziu quase pela metade. Além disso, as crises se multiplicaram e o ritmo de crescimento defrontou cada vez mais frequentes episódios de inflação, afetando os preços de alguns ativos importantes (o conhecido fenômeno das “bolhas”). Atualmente, a economia mundial se encontra diante da previsão de novos anos de estancamento, e a pergunta obrigatória nesse contexto, para uma reflexão sobre os motores da deterioração ambiental direta, é: o estancamento econômico é bom para o meio ambiente?

Pedindo desculpas aos leitores, façamos uma abstração momentânea dos temas vitais como a desigualdade e a pobreza, duas variáveis afetadas negativamente pela crise. Passemos a ver o que acontece em matéria de deterioração ambiental. Em algumas indústrias contaminantes, onde a contribuição à degradação ambiental se encontra fortemente correlacionada com o ritmo de atividade, é possível que a contração econômica tenha reduzido o avanço desse efeito. Porém, ao mesmo tempo, é possível que a crise tenha retardado a adoção de novas tecnologias mais eficientes. Em outros casos, como no das emissões de gases do efeito estufa (GEI), o panorama é mais complicado. Na União Europeia, as emissões vêm mantendo sua tendência de queda, mas não por causa da crise, mas sim porque vários países adotaram uma política industrial e um regime regulatório que definiram como prioridade clara a transição a energias renováveis. Em países como os Estados Unidos as emissões continuam crescendo apesar da crise, embora a um ritmo mais lento, precisamente porque não existe uma política energética que assegure ou acelere a transição a um modelo que utilize menos combustíveis fósseis.

Com relação ao aumento da população, o outro motor indireto da degradação ambiental, é preciso dizer que a taxa de crescimento demográfico se manteve numa tendência de queda, superando por pouco o 1%. O número de países que passa por sua “transição demográfica” (processo em que as taxas de mortalidade e de natalidade decrescem quase simultaneamente). Hoje, o principal fenômeno demográfico é o da urbanização. E esse traz consigo mudanças importantes em matéria de padrões de consumo e acesso a mercados.

Falar do crescimento das populações em geral não ajuda em muita coisa. É mais importante começar a falar da macrocefalia e da instabilidade do setor financeiro mundial, da concentração de poder do mercado em quase todas as indústrias do planeta, dos crescentes níveis de desigualdade e da evolução de variáveis econômicas como as taxas de rentabilidade e os salários. Sem entrar nesse nível de análise, é muito pouco o que poderemos entender sobre os motores da deterioração ambiental.

Tradução: Victor Farinelli

Fonte: Carta Maior
Foto: wikimedia commons

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