Professora da rede privada tem direito a hora extra por trabalhar no intervalo

04/09/18 | Lutas no Brasil

Para CNTE, decisão deve ser comemorada. Jurisprudência de ações trabalhistas será a única maneira de manter direitos e benefícios retirados pela reforma Trabalhista e terceirização irrestrita aprovada pelo STF

Uma professora do ensino superior receberá horas extras por ter atendido os alunos durante o recreio. A decisão é da Quarta Turma do Tribunal Superior do Trabalho (TST), que reconheceu que o intervalo entre as aulas deve ser computado como tempo de efetivo serviço, na forma da lei.

O caso aconteceu no Instituto de Desenvolvimento Tuiuti (IDT), de Curitiba (PR). A professora, que dava aulas nos cursos de Enfermagem, Biomedicina e Estética, disse que orientava e tirava dúvidas dos alunos durante o recreio e após o término das aulas. Segundo ela, a falta de orientação da direção para que os professores atendessem os alunos não retirava da instituição de ensino a obrigação de remunerar esse tempo como hora extra.

Para a vice-presidenta da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação (CNTE), Marlei Fernandes de Carvalho, é muito importante para a categoria que a Justiça reconheça essa atividade como parte das atribuições do educador e da educadora. Segundo a dirigente, a remuneração completa da jornada de trabalho dos profissionais da educação sempre foi uma luta muito grande de professoras e professoras de todo o País.

“Diferentemente do serviço público, na iniciativa privada não se contabilizam as horas-atividades, que são destinadas a tarefas como o atendimento ao aluno, correção e preparação de trabalhos. Além do profissional trabalhar 20h ou 40h semanais, tem ainda esse atendimento específico aos alunos, que também é considerado trabalho. Então temos, sim, que comemorar a coragem da professora que levou a situação até o final.”

Para Marlei, que também é secretária de Finanças do Sindicato dos Professores do Paraná (APP-Sindicato), a repercussão da ação é bastante positiva.

“A decisão também abre portas em um momento tão duro de retirada de direitos não só da educação, mas para as demais categorias que possam estar sofrendo situações semelhantes como essa”, avaliou a dirigente.

Outras decisões do TST mandam pagar recreio como hora extra, diz advogado

É exatamente esse o objetivo, concordou o advogado da causa, Valdyr Arnaldo Lessnau Perrini. Ele disse que, além desse caso específico, existem várias decisões no TST mandando pagar o recreio como hora extra.

“Já virou jurisprudência no Tribunal Superior”, celebra o advogado, que se diz otimista em relação a essas ações, mesmo que o processo tenha sido realizado anteriormente à reforma Trabalhista, como é o caso dessa professora, que entrou na Justiça em  2016, solicitando as reparações salariais.

“Quando eles [magistrados] entram no mérito, praticamente todas as turmas do TST têm entendimento nesse sentido. Aliás, não tem nenhum artigo na nova legislação que possa excluir essa decisão [de reconhecer o recreio como atividade de aula]. Eles [parlamentares que aprovaram a lei] não foram suficientemente malvados para prever tudo”.

Importância da sindicalização

Para evitar situações de abuso nas jornadas de trabalho, Perrini, que também é presidente do Sindicato dos Professores do Ensino Superior de Curitiba e Região Metropolitana (Sinpes), recomenda que os professores e professoras sejam sindicalizados, verifiquem se o sindicato é combativo e confiável, guardem todos os holerites [comprovante de pagamento] e tenham anotado os históricos dos horários e atividades de aula dos últimos cinco anos.

Ele acredita que ainda existe muito fôlego, do ponto de vista da Justiça, mesmo com a implementação das novas leis que massacram direitos e benefícios.

“O importante é confiar que os Juízes do Trabalho, principalmente da segunda instância dos Tribunais Regionais do Trabalho (TRT’s) e no TST, que ainda estão bastante sensíveis à situação dos trabalhadores. Estamos com uma primeira instância muito ruim, em sua maioria jovens recém-saídos da graduação, sem nenhuma experiência e sensibilidade social, que ganharam mesada para fazer concurso e ficaram deslumbrados com a caneta de juiz. Mas ainda dá para confiar na Justiça do Trabalho, sim”.

Estamos vendo que várias instâncias dos Tribunais estão dando a garantia que nós tínhamos antes da Reforma Trabalhista e agora com a confirmação da terceirização irrestrita pelo STF, avalia a vice-presidenta da CNTE.

“Por isso é muito importante essa jurisprudência, que acaba se transformando na principal opção para os trabalhadores e trabalhadoras porque, de fato, teremos de reconfigurar os direitos que tínhamos anteriormente, que já eram negados”, finaliza Marlei.

Entenda o caso

O Tribunal Regional do Trabalho da 9ª Região (PR) manteve a sentença do juízo de primeiro grau em que foi julgado improcedente o pedido da professora. O TRT destacou que, de acordo com os depoimentos colhidos, a assistência aos alunos acontecia “por mera liberalidade do próprio professor, que poderia atendê-los em outro momento”.

O relator do recurso de revista da professora, ministro Alexandre Luiz Ramos, explicou que o artigo 4º da CLT considera como de serviço efetivo o período em que o empregado esteja à disposição do empregador, aguardando ou executando ordens, “salvo disposição especial expressamente consignada”.

E a Súmula 118 do TST, por sua vez, consolidou o entendimento de que os intervalos concedidos pelo empregador na jornada de trabalho, não previstos em lei, representam tempo à disposição da empresa e devem ser remunerados como serviço extraordinário, se acrescidos ao final da jornada.

Por unanimidade, a Turma deu provimento ao recurso para acrescer à condenação o pagamento, como extras, dos minutos que a professora permanecia à disposição do empregador durante o intervalo entre aulas.

Com informações do site do TST*

Jurisprudência

O procurador do Ministério Público do Trabalho, Rodrigo Carelli, disse nesta segunda-feira (3), ao Portal CUT, que apesar da decisão do STF sobre terceirização irrestrita, “ainda há meios de recorrer à Justiça“.

Se o trabalhador entender que foi lesionado por causa de suas tarefas, ele pode – e deve – buscar orientação no sindicato e no Ministério Público do Trabalho porque se houver uma fraude, há meios jurídicos sim de buscar reparação”.

Para ele, as novas relações de trabalho que estão sendo implantadas no Brasil, provocam  a construção de novas jurisprudências.

Fonte: CUT
Foto: Reprodução

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