Lula e o Papa Francisco recebem prêmio Chico Mendes de Florestania

17/12/18 | Lutas no Brasil

Ex-presidente, que recebeu o prêmio por seu legado em defesa do meio ambiente, enviou carta que foi lida durante cerimônia. “As sementes que plantamos não serão derrubadas facilmente”, diz Lula na carta.

O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e o Papa Francisco receberam o prêmio Chico Mendes de Florestania, em cerimônia realizada pelo governo do Acre neste sábado (15), em Xapuri.

Lula foi premiado na categoria Nacional pelo seu legado em defesa do meio ambiente, mas, como vem sendo mantido preso político há oito meses na sede da Superintendência da Polícia Federal em Curitiba, não pode comparecer à cerimônia. O ex-presidente mandou uma carta de agradecimento, onde lembrou a trajetória de Chico Mendes e falou sobre a luta dos povos da floresta.

Na carta, lida pela atriz Lucélia Santos, Lula diz: “Justamente por não poder estar aí com vocês, me emociona demais essa homenagem. Ela mostra que, mesmo que hoje o dia pareça escuro, as sementes que plantamos, eu e Chico juntos, se transformaram em grandes árvores, que não serão derrubadas facilmente e que ainda darão muitos frutos e novas sementes, a serem plantadas por vocês, para um futuro melhor para o Acre, o Brasil e o mundo”.

A 15ª edição do prêmio, em meio à celebração do aniversário de 74 anos de Chico Mendes, lembrou as iniciativas que dão continuidade ao legado do maior ambientalista da América Latina, que ecoou a voz dos povos da floresta e deu início a construção de políticas públicas de base sustentável, com inclusão social e prosperidade econômica. Desde 2004, o prêmio homenageia personalidades empenhadas em consolidar essas ideias.

A entrega do prêmio a Lula foi um reconhecimento dos povos da floresta e dos acreanos ao amigo presidente que sempre esteve em suas trincheiras de luta. E a contribuição de Lula para o desenvolvimento do Acre e conquista de direitos dos acreanos é reconhecida por todos, em especial, por aqueles que encabeçaram bandeiras de lutas em governos que não atendiam as necessidades do povo.

Um deles é o xapuriense Raimundo Mendes Barros, 73 anos, que militou ao lado de Chico Mendes e se mantém como uma das principais lideranças extrativistas da atualidade. Foi ele o porta-voz da homenagem concedida a Lula no evento.

“Lula é irmão dos acreanos, portanto, é mais do que justo que prestemos essa homenagem a ele. Ele deu dignidade às populações rurais e urbanas, fez com que os recursos do Brasil chegassem aos quatro cantos do país, beneficiando aqueles que nunca tiveram vez: os pobres.”

Raimundão, como é conhecido, completou seu discurso clamando por justiça.

É injusto o que o nosso companheiro sofre hoje. Aliás, todas as injustiças sofridas por Lula também são sofridas por aqueles e aquelas que desejam e precisam de respeito, dignidade e distribuição de renda, coisa que essa direita nunca fez. Queremos que a justiça seja feita, queremos Lula livre

– Raimundo Mendes Barros

Papa Francisco

O Papa Francisco foi homenageado na categoria especial “De Francisco para Francisco”, um reconhecimento ao endosso do Santo Padre à defesa do meio ambiente, tema que tem sido uma das preocupações do atual pontificado e que apresenta como base a sua primeira encíclica, intitulada Laudato Si (português: Louvado sejas; subtítulo: “Sobre o Cuidado da Casa Comum, 191 páginas).

Leia a íntegra da carta de Lula:

“Governador Tião Viana e demais autoridades presentes,

Meus amigos, minhas amigas,

Quem conhece a natureza, como o povo do Acre conhece, quem conhece a Amazônia, quem cultiva a terra, sabe que da semente plantada até termos uma grande árvore leva tempo.

Por isso sabe quanto é importante plantar sementes na vida, cuidar com carinho e ter paciência até a árvore crescer e dar boa sombra e frutos.

Eu conheci o Chico Mendes na época da fundação do PT, junto com outros companheiros de todo país que queriam semear a luta pela democracia e justiça social. Um metalúrgico do ABC e um seringueiro de Xapuri com milhares de quilômetros de distância entre eles mas próximos no desejo de um Brasil melhor. Não éramos filhos de fazendeiros, de empresários, bacharéis. Éramos um metalúrgico e um seringueiro que percorreram longos caminhos.

Não tinha celular, não tinha internet, não tinha whatsapp, tinha telefone e olhe lá. A gente tinha mesmo era que rodar na estrada, viajar de ônibus, nos encontrar e valorizar cada encontro, cada troca de ideia.

O companheiro Chico protegia as árvores e os seus companheiros com a coragem, com seu próprio corpo. Em um fim de ano como esse, gente covarde e gananciosa achou que matando Chico, que tirando o corpo dele do caminho, iam esmagar a floresta e a esperança do povo do Acre. Eles achavam que matando Chico matariam sua luta.

Eu deixei a Marisa e as crianças às vésperas do Natal e fui em um aviãozinho me despedir do meu companheiro e falar exatamente isso para seus parentes, amigos e companheiros: as ideias de Chico continuariam vivas e cada vez mais fortes.

Hoje, 30 anos depois, podemos ver que muitas árvores nasceram das sementes plantadas pelo Chico.

O aumento da consciência ecológica dos brasileiros e no mundo todo, que resistem e irão resistir a ganância dos poderosos na proteção da Amazônia.

Com muita Justiça, tive a honra de batizar o nome do Instituto que cuida das unidades de conservação da natureza no Brasil de Chico Mendes.

O Acre era governado por gente que cortava com motosserras seus adversários. Os governos do PT no Acre, liderados pelo Tião e pelo Jorge Vianna, mudaram o estado, modernizando-o e trazendo desenvolvimento com consciência econômica e social. Não é fácil nem pouco ganhar 5 eleições seguidas. As pessoas começam a dar de barato conquistas feitas com muita luta e trabalho. Mas, meus amigos Tião e Jorge, não tenham dúvida de que vocês tem seus nomes na história do Acre e do Brasil.

A Marina Silva foi senadora, minha ministra do Meio Ambiente, depois disputou três eleições presidenciais. Como seria possível antes do Chico Mendes e do PT do Acre Xapuri ter uma filha da sua terra de origem popular candidata a presidência?

Eu hoje, infelizmente, não posso estar no Acre onde tantas vezes estive, para receber esse prêmio. Queriam matar as ideias de Chico Mendes. Querem calar as minhas. Nem entrevista me deixam dar.”

Fonte: CUT
Foto: SÉRGIO VALE/AGÊNCIA ACRE

Assuntos relacionados