Chomsky: ‘Dilma foi impichada por uma gangue de ladrões’

19/05/16 | Lutas no Brasil

‘Uma liderança política que não roubou está sendo impichada por uma gangue de ladrões. É claro que isso é um golpe.’

Enquanto os protestos no Brasil sobre o voto dos legisladores para suspender a presidente Dilma Rousseff do cargo e levá-la a julgamento continuam, Noam Chomsky nota que “tem-se uma liderança política que não roubou para benefício próprio e que está sendo impichada por uma gangue de ladrões, que o fizeram. Isso conta como um golpe brando”.

O substituto de Rousseff, o vice-presidente do Brasil, Michel Temer, é membro do partido de oposição PMDB, que está envolvido em um escândalo de corrupção massiva envolvendo a estatal petrolífera Petrobras, e agora apontou um Gabinete exclusivamente branco e masculino acusado de implementar políticas pró-corporações.

AMY GOODMAN: E sobre o que está acontecendo agora no Brasil onde os protestos sobre o voto dos legisladores para suspender a presidente Dilma Rousseff do cargo e levá-la a julgamento continuam? Agora, El Salvador recusou reconhecer o novo governo brasileiro. O presidente Salvadorenho Salvador Sanchéz Cerén disse que a expulsão de Rousseff tem a “aparência de um golpe de estado”. O que está acontecendo lá para você? Pareceu talvez que Bush salvou a América Latina simplesmente por não focar nela, totalmente implicado com Iraque e Afeganistão. Parece que a administração Obama está prestando um pouco mais de atenção.

NOAM CHOMSKY: Bom, eu não acho que é sobre não prestar atenção. A América Latina tem, até um certo ponto, se libertado da dominação estrangeira – principalmente dos EUA – nos últimos 10 ou 15 anos. Isso é um desenvolvimento dramático em políticas externas. É a primeira vez em 500 anos. É uma grande mudança. Então a chamada falta de atenção se dá parcialmente pelo fato de que os EUA estão sendo retirados do hemisfério. Eram capazes de derrubar governos, emplacar golpes por mera vontade. Eles tentam. Houve três – dependendo do modo como você conta – golpes ou tentativas nesse século. Um na Venezuela em 2002 que foi vitorioso por dois dias, apoiado pelos EUA, derrubado pela reação popular. Um segundo no Haiti em 2004, vitorioso. Os EUA e a França – o Canadá ajudou – sequestraram o presidente, o mandaram para a África Central, e não permite que seu partido concorra a eleições. Esse foi um golpe vitorioso. Em Honduras, com Obama, teve um golpe militar que depôs um presidente reformista. Os EUA estavam praticamente sozinhos legitimando o golpe, dizendo que as eleições sob o regime autocrático eram legítimas. A sociedade de Honduras, sempre muito pobre e oprimida tornou-se uma câmara dos horrores. Um grande fluxo de refugiados, os jogamos de volta à fronteira, de volta à violência, a qual ajudamos a criar. No Paraguai, houve um tipo de semi-golpe. Também para livrar o país de um padre progressista que estavam comandando o país por um período breve.

O que está acontecendo no Brasil agora, é extremamente infeliz em muitos aspectos. Primeiramente, existe um nível de corrupção massivo. Infelizmente, o Partido dos Trabalhadores (PT), o partido do Lula, que teve uma oportunidade real de alcançar algo significante, e até fez algumas mudanças positivas, se juntou aos demais – à roubalheira da elite tradicional. E isso deveria sofrer punição. Por outro lado, o que está acontecendo agora, o que você parafraseou de El Salvador, na minha opinião, está correto. É um tipo de golpe brando. A elite sempre detestou o PT e está usando essa oportunidade para se livrar do partido que ganhou as eleições. Eles não estão esperando pelas eleições, que eles provavelmente perderiam, mas eles querem se livrar do partido, explorando uma economia em recessão, que é séria, e a corrupção em massa que está sendo exposta.

Mas até mesmo com apontou o The New York Times, Dilma Rousseff é talvez a única figura política que não roubou para benefício próprio. Ela está sendo acusada de manipulações financeiras, que são muito comuns em muitos países, tirando de um bolso para por em outro. Talvez seja um delito de algum tipo, mas certamente não justifica impeachment. De fato, tem-se uma liderança política que não roubou e que está sendo impichada por uma gangue de ladrões, que o fizeram. Isso conta como um golpe brando.

Fonte: Carta Maior

Foto: Reprodução

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