A progressiva destruição da Constituição de 88

05/10/16 | Lutas no Brasil

Escrito por: Graça Costa e Pedro Armengol de Souza

Secretária Nacional de Relações de Trabalho e Secretário Nacional de Relações de Trabalho adjunto.

A Desvinculação de Receitas da União (DRU) foi instituída em 1994 pelo governo do Fernando Henrique Cardoso, cujo nome na época era Fundo Social de Emergência (FSE). A medida seria temporária com o intuito de estabilizar a economia logo após o Plano Real através da flexibilização do orçamento federal, ou seja, da desobrigação constitucional de destinação do orçamento para determinados serviços públicos. Foi em 2000 que a medida passou a se chamar DRU. Desde aquele período, a DRU foi sendo renovada por todos os governos que passaram, descumprindo a promessa de que teria prazo de validade.

Na verdade, a DRU serve para que o governo federal use parte do orçamento conforme os seus interesses e à revelia do que a Constituição de 88 determinou. O principal avanço social pela Constituição Cidadã, como é conhecida, foi a criação da Seguridade Social e, com ela, o Orçamento da Seguridade Social. Este preceito envolve três pilares, a Previdência Social, a Saúde e a Assistência Social. Envoltos de um espírito cívico e de um ambiente de forte pressão popular, os Deputados Constituintes de 88 determinaram a vinculação do orçamento federal ao atendimento da Seguridade Social, que é considerada uma das maiores políticas públicas do país e um dos principais direitos conquistados pela sociedade brasileira.

O que todos os governos fizeram desde 1994, ao protelar a DRU, foi ferir gravemente direitos constitucionais da população e da classe trabalhadora, com prejuízo especial sobre a Seguridade Social, entre outros, como a educação pública, ao comprometer seriamente o financiamento dessas políticas. Governo após governo, esta medida foi sendo renovada, desviando recursos da União para outros fins, conforme a vontade de cada um que passou pelo Palácio do Planalto. Porém, pode-se afirmar que o principal objetivo de todos os governos que a utilizaram foi o pagamento dos juros e amortizações da dívida pública do Estado Brasileiro.

O orçamento da União, através da DRU, teve parte considerável dos seus gastos destinados ao superávit primário, que nada mais é o pagamento dos juros da dívida. Ao invés do Estado cumprir o que a Constituição de 88 determinou, o atendimento dos direitos e necessidades da população mais carente e do trabalhador, através da prestação de serviços de saúde e educação pública, de previdência e assistência sociais de qualidade, só para citar estes serviços, os governos transferiram volumes exorbitantes de dinheiro público para as mãos de poucas famílias privilegiadas detentoras dos títulos públicos da dívida da União.

Para se ter uma dimensão do montante a que estamos nos referindo, só em 2014, segundo a associação Auditoria Cidadã da Dívida (basta ver o link http://www.auditoriacidada.org.br/blog/2013/06/20/e-por-direitos-auditoria-da-divida-ja-confira-o-grafico-do-orcamento-de-2012/), o governo federal gastou impressionantes R$ 978 bilhões com juros e amortizações da dívida pública, o que representou 45,11% de todo o orçamento efetivamente executado naquele ano. Isso significou, segundo a associação, 12 vezes o que o governo federal destinou à educação, 11 vezes os gastos com saúde, ou mais que o dobro dos gastos com a Previdência Social em 2014.

E para agravar ainda mais esta situação profundamente injusta e revoltante, foi promulgada pelo Congresso Nacional, no dia 08/09/16, a Emenda Constitucional 93/2016, que estabelece a renovação da DRU por mais sete anos, com o aumento da desvinculação do orçamento da união dos atuais 20% para 30%. Além disso, a emenda também instituiu a Desvinculação de Receitas dos Estados, Distrito Federal e dos Municípios (DREM). A medida aprovada produz efeitos retroativos a 1º de janeiro deste ano, permitindo ao governo golpista já realocar livremente 30% das receitas obtidas com taxas, contribuições sociais e de intervenção sobre o domínio econômico (Cide). A expectativa é que a medida libere R$ 117,7 bilhões para uso dos golpistas apenas em 2016, sendo R$ 110,9 bilhões de contribuições sociais, R$ 4,6 bilhões da Cide e R$ 2,2 bilhões de taxas.

Quer dizer, se já não fosse o bastante ter surrupiado o dinheiro público destinado a atender as necessidades da população e da classe trabalhadora durante longos 22 anos, o atual governo golpista, juntamente com o Congresso, prolongou a política por mais sete anos e ainda aumentou substancialmente o volume a ser desvinculado. Isso significará o aumento da desigualdade social já tão alarmante do Brasil.

É importante lembrar que muitos desses direitos consagrados na constituição, como a saúde pública, a educação pública e a assistência social, são executados na prática pelos municípios, que têm os seus orçamentos majoritariamente dependentes das transferências da União. Portanto, não é preciso dizer que os municípios serão também muito prejudicados com a aprovação desta medida, pois terão os seus orçamentos comprometidos com graves reflexos à prestação dos serviços públicos à população.

Além da DRU, outras três medidas do governo golpista foram aprovadas pelo Congresso. A Lei 13.303 de 30 de junho de 2016, conhecida como a Lei de Responsabilidade das Estatais que, se não destrói, limita substantivamente as políticas públicas do Estado através das suas empresas estatais. A Medida Provisória (MP) número 727 de 2016, denominada Programa de Parcerias de Investimentos (PPI), que retoma o programa de privatização, agora concentrando todas as decisões e iniciativas no Poder Executivo Federal, mesmo de empresas estatais estaduais e municipais. A MP 726 de 2016, da Reforma Ministerial do governo golpista de Temer que, entre outros atentados às políticas sociais, extinguiu o ministério da Previdência Social transferindo a gestão da Previdência para o Ministério da Fazenda.

Nesse projeto de destruição progressiva dos avanços conquistados na Constituição de 88, o governo golpista de Temer ainda tem dois projetos a serem aprovados pelo Congresso e que estão em processo acelerado de tramitação. O mais grave deles é a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 241 de 2016, conhecida como o Novo Regime Fiscal. A PEC limita os gastos públicos federais por 20 anos, além de acabar com a atual vinculação de receitas para gastos com saúde e educação públicas, previstas na Constituição. Essa medida é tão grave que representará, caso aprovada, o fim dos direitos sociais. Por fim, há o Projeto de Lei Complementar (PLP) 257 de 2016, intitulado de Renegociação das dívidas dos estados com a União, que agora tramita no Senado como Projeto de Lei da Câmara (PLC) 54 de 2016. Tal projeto acaba tanto com o serviço público quanto com o servidor público, pois suspende os concursos públicos, restringe substancialmente os reajustes salariais, entre outras medidas de restrição fiscal, pelo prazo de 2 anos, em troca do alongamento das dívidas de estados e do Distrito Federal com a União por 20 anos.

Diante desse cenário ultraconservador e ultraliberal vivenciado no país, a CUT continuará lutando contra os retrocessos impostos por esse governo golpista e usurpador, contra o ataque às garantias que a Constituição Cidadã de 88 estabelece para a população carente e a classe trabalhadora desse país.

Paralisação Nacional dia 5 de outubro! Rumo à Greve Geral! Nenhum direito a menos!

Graça Costa

Secretária Nacional de Relações de Trabalho

Pedro Armengol de Souza

Secretário Adjunto Nacional de Relações de Trabalho

Fonte: CUT Brasil

Foto: Reprodução

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